sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Lacrimejava
Santa Maria, mãe de Mateus.
Perdeu o bebê com uma bolada na barriga.
O artista não nasceu...

A família esmureceu
As manhãs cinzas
o pai cizudo.
As filhas de cinza.

A mãe murchou
e buscava em todo lugar
o filho que perdeu.
Só não lembrava dos demais, ali vivos e saudosos da mãe.

As filhas tiveram seus filhos
e se prometeram ser melhores.
E o artista renasceu
e seguiu.

Uno Verso

Uno verso
Verso único
plenitude.

Único verso
Une versos
vastidão.

Versos unidos
Em verso único
Eu, você: universo.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Personal Velocity

Quando chegar aos meus 30 eu saio da minha aposentadoria de não sei o quê.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Sonho do Paulinho dessa noite passada

"Mãe, sonhei que quando eu completava 6 anos aparecia um terceiro olho na testa, minha e de outras crianças"

Ai meu Deus.... Jesus só foi pro deserto depois dos 18 anos; Sidarta só foi pro exílio depois de moço! Segura a onda muleque!

Batuque na cozinha

A cozinha era ampla, azulejos antigos, extremamente limpos. Flores azuis e laranjas decoravam alguns dos azulejos e outros eram lisos em um tom claro de laranja, desbotados de tanta limpeza. O fogão, substituía o antigo fogão a lenha do casarão. A pia foi instalada dentro da casa apenas 10 anos atrás e agora ocupava um lugar ao lado da geladeira antiga, nada de vintage, apenas velha mesmo. Sem muitos utensilhos modernos ou fantásticos a decoração era acidental, feita por frutas, carne secando,queijo, rapadura e doce de leite. Colheres de pau, panelas cautelosamente ariadas, amassadas pelo tempo e com os cabos meio frouxos, mas brilhantes!
Chegamos A Mesa. A Mesa, feita pelo dono da casa 40 anos atrás, era muito rústica, desgastada e rodeada por bancos que acompanhavam o estilo. Os bancos incrivelmente comportavam toda uma família que não parava de crescer - exceto pelos bebês que eram acomodados ou nos fartos seios das mães ou sobre a mesa. A mesa era o centro do ambiente e mesmo na alta madrugada tinha sempre alguém sentado sobre esse altar.
Essa mesa é o totem da família. Nascimentos, mortes, brigas, casamentos, acordos, risadas, lágrimas, sussurros, suspiros, de tudo a mesa compartilhava, todos os rituais aconteciam nela. Na mesa a todo momento mais um se sentava e abria seu coração, recebendo em troca um caldo de acalanto, um pão de reconforto, uma colherada fresquinha de doce de recompensa.
A gente dessa família era como toda gente de toda a família. Uns eram exemplares e cheios de deveres, principalmente com as aparências. Outros eram desconectados desse planeta e muito amados nas reuniões de família porque eram carismaticamente loucos. Para outros tudo era amargura, sofrimento e dificuldade, mas sempre eram os mesmos. Para alguns tudo era sem sentido e apareciam de 10 em 10 anos. Outros tinham um segredo tão profundo que todos sabiam.Uns eram pais, outros eternos filhos. Mas todos se encaixavam e todos pertenciam de alguma forma por algum motivo. Todos amavam e recebiam amor, de alguma forma.
A matrona, linda em seus milhões de curvas, no seu olhar aguçado e no sorriso escadaloso, não era boa em respeitar as regras que ela mesma criara: lambia a colher e voltava para o pote, entrava com os pés sujos da terra do quintal, enfiava o dedo no bolo e jogava bola dentro da cozinha com os caçulinhas da família.
Enquanto ela mexia seu caldeirão, fazia sua alquimia, todo o corpo mexia e correspondia a dança daquela bruxaria boa que eram seus pratos. Quando ela batia seus preparos - sempre a mão - todos, principalmente as crianças, adoravam ver os braços dela saculejando junto a batida. Era mais poderoso que qualquer eletrodoméstico.
Ela fumava um paiol na cozinha e o velho se sentava na mesa com outros tantos e vigiava o queijo. A todo momento que alguém cortava uma fatia, muito espertamente o senhor dizia "Você está alejando meu queijo" e cortava mais uma fatia para si, a pretexto de deixar o queijo meticulosamente reto.
Algumas vezes a cozinha virava terreno feminino, inundado de vozes agudíssimas, risos altos e orgásticos e com um cheiro no ar de alho, cuminho e mulher. Elas se juntava, cozinhavam, penteavam umas as outras, contavam cabelos brancos, descascavam o esmalte, falavam dos amores, dos filhos, das vaidades, das verdades e das mentiras. Morriam para descobrir os segredos umas das outras e quase nunca conseguiam segurar os segredos das que estavam ausentes. Era como se fosse o momento de atualização das novidades da família, porque dali da cozinha tudo retumbava pelos corredores e quartos do casarão.
Na hora de lavar a louça e fazer o café o velho regia o santuario. E aos poucos iam se achegando os demais homens da família. Não ajudavam em nada,falavam do futebol, da formula 1, do carro, da dívida, dos negócios deles e dos outros. Contavam das mulheres, dos filhos e do trabalho que davam. estufavam o peito para contar das proezas deles e dos filhos. Não raro pediam conselhos sobre assuntos delicados. Coçavam o saco, cospiam pela porta que dava para o quintal e os estudados olhavam para aquilo e se sentiam mais homens imitando os mais rústicos. Voltavam para suas vidas fortes e orgulhosos dos homens que eram. As vezes voltavam miudinhos e pensativos, pois o velho que era calado, quando falava ou era sabedoria pura ou crítica dura.
Tudo ia acabando com o por do sol de domingo, ficavam ecos pelas paredes e ressoava a solidão da semana no anoitecer. A matrona, rouca de tanto falar e reger cerimônias ia se recolher e jejuar de companhia em seu canto e o velho com sua mente exausta de tentar solucionar a vida alheia ligava seu rádio e ouvia o Om da má sintonização da estação Am de rádio. Era o mantra que sintonizava ele com o vazio e limpava sua mente para a próxima cerimônia.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Cidade Hippie

Acordei louca para surpreender meu parceiro. Certo, vamos praquela cidadizinha hippie, cachoeiras, comidinha caseira, pousada gostosa, friozinho da noite, sauna, e só nós dois!
Malas prontas, carro pronto, e a alma louca pra se esbaldar. Era um domingo, a ideia era aproveitar dias fora de temporada e estrada vazia pra curtirmos juntos. Bom, haviam dois caminhos, decidi ir por um que não conhecia bem mas supostamente estava em melhores condições.
O carro seguia bem, as vezes esquentando quando ligava o ar e a chuva comia solta na estrada. Andei, andei, ele dormia tão lindo do lado. E eu andava, andava e percebia que a estrada era muito estranha, Ele acordou e paramos num posto, a resposta do vendedor foram algumas risadas e uma olhada no mapa: estávamos indo pra Belo Horizonte...
Tá bem, não sou expert em viagens, estradas... Eu estava ainda com bom humor, ele ria junto e seguimos voltando. A chuva melhorou, pensei em ir pra casa e ficar nas cobertas mesmo, mas a vontadinha de escapar foi maior.
A estrada estava boa e comecei a me animar. Eu ia dirigindo super bem (sem óculos e meio assustada desde meu último capotamento), meu namorado estava do meu lado e comentando que eu dirigia bem.
Chegamos na cidade, depois de errar a entrada, mas não tinha problema, queríamos jantar e encontrar um cantinho pra dormir, pegar uma sauninha. Quartos de domingo deveriam ser bem baratos, mas não nessa cidade. Sem noção, os pousadeiros continuavam cobrando preços absurdos. Mas tudo bem, desde que tenha sauna. Todas quebradas... Fomos na de cama gostosa e gente simpática. Nas demais o programa do Faustão não permitia que as pessoas nem se mexessem.
A comida que achamos foi fantástica! Mas eram daquelas que deixam você pesado uma viagem inteira. Mas gostosa. Eu estava num resfriado chato, e fomos pro hotel dormir e torcer por uma segunda bacana com cachoeiras, etc, etc.
A manhã demorou a chegar para nós, umas 11! Obviamente aquela gente simpática da pousada nos disse simpaticamente que o café já tinha acabado. Tudo bem, vamos aproveitar para ir no famoso brunch hippie da cidade, fechado! Bem, 11 e meia, meio dia... Fazer o que? Tomar um café qualquer na rua e andar sem rumo.
Fomos andando, lojinhas bacanas, muitas fechadas. Muita gente parada pela rua, a toa... Muita gente perdida e bêbada. Vamos pra estrada, atrás de uma cachoeira, finalmente, 2 e meia... E íamos, íamos e o que meu nariz me disse pra eu ir dormir. E voltamos, voltamos. A cama confortável foi importante, passei a tarde nela. As vezes percebia de rabo de olho um lindo moço me espiando. Paradinho em suas férias, se entretinha até com os textos do guia turístico.
Um dia que acabou e eu ressuscitei no por do sol. 5 horas, vamos em busca de um bom por do sol na estrada. Ninguém ainda tinha relaxado, não tinha lugar para ir aquela hora. Dirigimos, dirigimos, paramos na beira da estrada. Sentamos e parados por uns 40 minutos, filosofamos. E a bunda ficou marcada pelas pedras do acostamento. E vimos um sol bonito, que renasceria lá no Japão em breve.
Voltamos, comemos, dormimos para acordar cedo e pela manhã seguimos sem muitas delongas.
Eu vi que minha encantada cidade hippie não estava lá; e que as segundas feiras dos hippies são maçantes e mortas.
Mas vi um parceiro verdadeiro que se dispôs a se aventurar, que não se indispôs por se perder, que acolhe a namorada resfriada, que mantêm um sorriso mesmo numa beira do nada de estrada.
Viva eu e você, e basta!

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Acredito que a poesia morreu. Quero ressucitá-la com música! Algum compositor pra fazer dupla?

Sabedoria Natural

Sempre há de ter alguém
com um sorriso escondido no rosto.

Sempre há de ter alguém
com um lindo dia escondido no bolso.

Sempre há de ter alguém
que se refugia atrás de outro dorso.

Sempre há de ter alguém
que acredita em santos ocos.

Sempre há de ter alguém
remoendo as entranhas dos outros.

Sempre há de ter alguém
para sorrisos escancarar.

Sempre há de ter alguém
para dias transformar.

Sempre há de ter alguém
para por os outros para encarar.

Sempre há de ter alguém
para a fé alimentar.

Sempre há de ter alguém
para almas restaurar.


terça-feira, 27 de setembro de 2011

Equilíbrio

A mão trêmula,
a perna trêmula,
a boca trêmula.

A palavra firme,
a voz firme,
o peito firme,
a vontade firme

Os pés firmes;
um nó firme
atando o coração.

Embarcação

Ao acaso que embala o mar
minhas ideias vão junto.
A deriva, longe do pensar.
Mas um dia boto tudo num bote
e as levo comigo
para um mar tranquilo
de brisa branda
e volto a navegar.
E quem sabe, a sorte
me ofereça um por-do-sol eterno
e vou seguindo-o sempre.
E assim tenho tudo;
a abundante Criatividade
e a divina Inspiração.
Sou artista.
Minha nau eu guio,
meu rítmo eu dito,
tenho tempo e direção.

Onde mora

Viver na cidade ou na floresta
tudo vale a pena.
Nossa casa é dentro da gente
pra ser bom é só tirar o que não presta.

Sertanejo

Se eu fosse lá do sertão
viveria simplicidade
Mas sou ser complexo
eu vivo cidade...

Complexo tem seus lados
como tudo que é da vida.
Tem a alegria da variedade,
opções sem garantia.

Mas é esperto quem traz em si
as certezas de bicho de mato:
que boa plantação dá boa colheita;
que a alma se vai no retrato.

Que não existe lugar melhor
que o lugar que se está;
que alegria é doença
e tudo há de contagiar.

A sorte é feita pela gente
o azar é lição a ser aprendida.
Amar é a melhor das coisas
mesmo deixando ferida.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Paz pelo ralo

Eu queria saber onde está aquela paz que ficava na minha varanda, deitada na rede, dentro de mim. Escorreu pelo ralo, deixou um vazio que agora não tem fim. A angustia tomou conta e as nuvens tampam o sol, só resta olhar pro chão.

domingo, 11 de setembro de 2011

Um pouco de ...

Pretendo que a poesia tenha a virtude de, em meio ao sofrimento e o desamparo, acender uma luz qualquer, uma luz que não nos é dada, não desce dos céus, mas que nasce das mãos e do espírito dos homens." Ferreira Gullar

Amo-te

Amo-te enfim, de um calmo amor presente
E te amo além, presente na saudade.
Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Planos

AH, esses planos,
quando toma minha cabeça
tiram meus pés do chão
me estiram no meio do céu
e me aconchegam nas nuvens

Num esforço, recoloco os pés na terra
e dou uma peneirada
e me reorganizo com os planos
e as expectativas são substituídas
por passos e decisões.

Os planos alimentam meu coração
e meu ímpeto.
A força de vontade para tudo
fica duplicada.
Fica escancarada na minha pressa de me desazer das antiguidades.

Quero finalizar o que comecei antes.
Pra finalmente retomar
a estrada da inspiração.
Ainda mais agora,
com você nos planos, não existem limites.

"Juntos somos invencíveis!"
Dizia uma das primeiras músicas
que escutamos juntos.
E como tudo na vida,
não foi à toa.

"Ao infinito e além!"

domingo, 21 de agosto de 2011

Receita de amor derradeiro

Sabe por que estou tão envolvida e feliz assim?
Porque eu não quero te mudar!
Eu não quero que você emagreça ou engorde.
Eu não quero que você se depile ou tenha mais cabelo.
Eu não quero que você saiba mais ou saiba menos.
Eu não quero que seja menos (ou mais) safado.
Eu não quero que você more longe ou perto.
Eu não quero ir mais devagar ou rápido.
Eu não quero mudar seu jeito de respirar,
Seu bafo matinal, seu cheiro depois do trabalho, seu amor pelo Flamengo.
Tá tudo no ponto certo.
Você e eu evoluímos individualmente e em conjunto no tempo certo.
Somos jabuticabas de novembro
prontos para a felicidade das chuvas de verão que já chegaram.

Inspiração

A inspiração surgiu.
Levantei a caneta,
levantei o pincel,
o lápis de cor, a câmera.
Levantei a voz!
Mas parece que não falo estas línguas...
A inspiração não vingou.
Expressa-la, ou as tentativas
a dissipou.
Perdeu-se no imenso vazio do Eu.
O Eu a comeu.
Enquanto houver um Eu
não haverá mais nada.
E toda a forma de inspiração
será dissipada.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Se a vida é curta, porque a noite é tão longa?

Era um belo fim de tarde de domingo, todas as estrelas estavam se preparando para brilhar. Nesse mesmo momento do céu um pedaço de nuvem desceu e tomou toda a cidade, todo o campo e todos os corações. Na vila baixa, todos se recolheram e na floresta os passáros dormiram mais cedo. Nesse momento, todos dentro de si mesmos, todos estavam no espelho e todos decidiram se olhar. Tudo que puderam ver a priore foram seus contornos, formas, cores, tamanhos. Depois viram o medo, a angustia, a aflição, o frio, o desespero. Aos que continuaram olhando, foi surgindo de mansinho uma luz no reflexo. A luz vinha de dentro e se expandia pra fora e a esses foi permitida A Visão. Era O Amor e uma consequente Feliciade. E só isso. As estrelas venceram as nuvens, a lua consequentemente teve espaço e todos foram dançar no coreto da praça no meio da noite.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Caro Amor,

Eu sempre quis, muito, muito te amar. Porque você era o desenho do homem idealizado pra mim. Viajante, meio gringo, Hugh Grant, estudado, importante, cativante, perfeitinho, de terninho, burocrata, etc...etc...
Eu sempre quis tanto te amar que eu tentei de primeira e, com muito medo, recuei, porque eu queria amar minha estátua e não me machucar amando alguém de verdade.
Eu sempre quis muito, muito te amar. Que por não ter acesso a você eu fui de encontro ao teu semelhante e eu o usei para tentar te encontrar, infelizmente.
Eu sempre quis, muito, muito te amar. Te apresentar as pessoas em volta orgulhosa,para mostrar o homem-prémio que você seria pra mim se ficássemos juntos. Porque você era alguém que apesar de tantas oportunidades de ser alternativo, decidiu ser um homem sério e próspero, perfeitinho do jeito que se espera de alguém nos dias de hoje.
Eu quis te amar, mas não amei, porque na verdade eu nunca achei essas coisas de fato importantes ou merecedoras do meu amor. Recebiam no máximo minha admiração iludida...
Eu te amei no dia em que você ficou nu na chapada e não se inibiu por nada, nem por ninguém, e convenceu todos da sua liberdade.
Eu te amei quando você tocou violão lá na casa da piscina e me fez fechar os olhos pra ouvir seu coração.
Eu te amei quando você veio de manquine até a piscina e nos sorriu com o corpo todo.
Eu te amei por saber que você estava se permitindo amar com outra moça.
Eu te amei quando você abriu seu coração para nossa amizade novamente.
Eu te amei quando você, mesmo tendo me ferido, decidiu ser franco, honesto, mesmo correndo o risco de ter minha raiva para sempre.
Eu te amei quando você falou de um dos seus momentos mais secretos e de seus medos sobre ele.
Eu te amei quando te vi constelar numa história tão linda que é a da tua vida, e nas decorrentes conversas sobre sua história, suas ambições, seu futuro.
Eu te amei quando você admitiu seu ciuminho, tão humano.
Eu te amei quando fiquei te olhando enquanto mexia com o taro e você tocava ao meu lado.
Eu te amei quando você me sorriu de manhã e me deu bom dia, me assediando mais uma vez!
Eu amei em você todas as coisas que tenho medo de amar, de admitir que me fascinam, de deixar fazer parte da minha vida. Eu amei e amo em você aquilo que mais desejo libertar em mim. A palavra amo é forte, mas é a única que pode traduzir o que eu sinto. Esse amor não é daqueles desesperados, que estão na expectativa do futuro, mas é o que é, que contempla amizade também e já acha maravilhoso o que se pode ter. As expectativas sempre foram fruto da estátua, das ilusões.
Eu sei que você gosta de mim, que tem carinho e consideração. Eu também os tenho por você. Eu tinha começado a escrever essa carta antes, muito mais em reverencia a nossa história que em contemplação ao nosso presente. E é pra mim a vitória sobre o meu medo de me aproximar demais de você, de me expor e não ter atendidas as minhas expectativas, me ferir gravemente porque sei do seu jeito de levar as coisas e costumava ser muito diferente do meu.
Tenho agora uma imagem de você se transformando e crescendo, e essa talvez seja uma das coisas que eu mais admire do presente. Eu sei que esta mudança é muito mais em outras esferas e que na amorosa possa ser que seja a última acontecer, e eu talvez nem desfrute dela. Mas essa é a parte da carta que contempla nosso presente.
As minhas expectativas – deixando as ilusões de lado - são que esse momento tempestuoso passe, que tudo se reequilibre e que possamos continuar nos reconhecendo e se abrindo cada vez mais, nos sentindo livres para nos apaixonarmos, sermos bregas ou para voltarmos a nossa boa amizade.
Com carinho, Dani Colonizada.

Caros amigos,

Com quase todo mundo eu falo besteira. Com quase todo mundo eu conto meu passado negro. Com quase todo mundo eu sou utilitarista. Com quase todo mundo eu dou risada, com quase todo mundo eu passo dos limites.
Pois bem.
Com quase ninguém eu consigo tocar/ser tocada sem pensar que vai ser pra sexo. Com quase ninguém eu sento pra conversar e exponho meu ponto sem receios e sem cuidados com as palavras. Com quase ninguém eu admito não ter ido no Itiquira. Com quase ninguém eu danço de olhos fechados. Com quase ninguém eu ando na laminha do lago paranoá. Com quase ninguém eu me importo como num clã. Com quase ninguém eu vou a aulas experimentas de danças bizarras. Com quase ninguém eu divido a cama. Com quase ninguém eu divido minha fé. Com quase ninguém eu divido minhas limitações. Com quase ninguém eu divido meus textos. Com quase ninguém eu divido meu amor. Com quase ninguém eu divido minha voz e com quase ninguém eu divido meu lar.Com quase ninguém eu divido meu filhote. Com quase ninguém eu sinto cócegas. Com quase ninguém eu divido minhas raízes. Com quase ninguém eu divido minhas idéias brilhantes.
Enfim...
Eu fui nesse ano mais uma vez pra perto de pessoas que eu queria estar perto, mas temia serem tudo aquilo que eu preconcentuava. Fui chegando de novo, porque a atração era forte, mas havia medo ainda, havia pé atrás. Nessa ano vi que findou a desconfiaça e reinava a pureza do sentimento pelo grupo tão bacana que eu admiro e defendo com unhas e dentes. Eu adorei passar tanto com vocês,em tantas histórias.

Peguei a estrada goiana
estrada torta e profunda
a cidade já não me cabe
o indio segue a visão

Aprontei minha sacola,
disse adeus com sorrisos
deixei meus amigos
mas levei a canção

Se Deus quiser eu volto
com histórias e sementes
com tanto de tanta gente
que vai estar lá no sertão

Não tenho medo de nada,
boto arruda no bolso
um sorriso no rosto
e boto meus pés no chão

Vou trabalhar na terra
deixo pra trás toda essa gerra
vou suar pelo o que como
e buscar minha inspiração

Vou plantar, vou colher,
na verdade tudo vai nascer
dentro do meu coração.

Miau

Eu não sei bem como dizer
Hoje vocês terão de ir embora.
E logo hoje, dia do adeus
Vocês sentam no meu colo,
Riem, brincam e choram.

Parece que já sabem bem
Que no meu coração há um lugar
Que não tem gente alérgica, que não pega fungo
Que não se importa com caixa de areia
Nem com a gastança pra te humanizar

Hoje esse lugar vai ficar vazio
Vocês foram os gatos que quase tive
Que vão deixar esse buraquinho no peito
Meio incerto se está tudo certo em devolvê-los
Certo do meu fracasso, despeito

Desistir parece-me mais duro que iniciar
Porque um vem com um impulso
Impulso de todo começo
Desistir é tão parecido com derrota
Vem abarrotado de pesar

Vocês passaram aqui
Sou grata pelos dias que vivi
Com vocês pulando ao meu redor
E me trazendo de volta a casa da vó

A vida passa e quase ninguém vê
Você cuida de mim e eu de você.