Bem
ali, na beira do espelho dágua do Setor Bancário Sul, lava seus cabelos a Vênus do chafariz.
Cantando e sorrindo esta deusa Oxum-Vênus cuida de suas belezas. De short, regata
branca colada, cabelos até os ombros, ali às 15 horas ela faz do chafariz seu salon de beauté.
Seu
trabalho exige este cuidado diário. Como uma Greta Garbo, era necessário
cabelos brilhantes, pele macia, sorriso alvo, pernas belas e bem cuidadas. Seu
corpo todo coberto de água oxigenada é agora alvo de Hélios, o deus-Sol que
beijava seu corpo enquanto a deusa espera seus pelos clarearem – uma
preferência racista tipicamente brasileira. A expectativa é de que o corpo seja
tomado pelo bronze e os pelos sejam tomados pelo dourado.
Janelas dos sérios escritórios
ao redor se abriam para fitar a deusa. A ridicularização de quem vem com os
dedos apontados do alto disfarçam o desejo de fazer como ela; de ser como ela;
de estar com ela...
A deusa enxágua seus cabelos e faz um arco pelo ar com as
águas turvas do chafariz. Ignora os narizes tortos, se banha toda
bronze-dourada, se mima como qualquer mulher-deusa deve fazer diariamente. Lava
suas pequenas peças de roupa, dá ajustes a sua meticulosa sobrancelha. Se
veste com as peças que mal secaram e sai orgulhosa, diva, com seu falo altamente
destacado,sendo esta o maior atração de seu espetáculo, para os seus clientes
afoitos e carentes que estavam por chegar.
Ela, encantada e encantadora, finaliza
seu ritual de beleza. Às 18 horas ela inicia seu turno de trabalho e os
clientes – muitos ocupantes dos opressores prédios a sua volta – não se
felicitam em esperá-la. Querem dividir com ela seus desejos, sonhos, suas
drogas, seus submundos... Coisa que não cabe nas paredes de suas
casas, de seus escritórios, ficam para sempre dentro de um armário na
escuridão.